quinta-feira, 19 de agosto de 2010

O que é Sociologia.

FICHAMENTO


MARTINS, Carlos B. O Que é Sociologia. São Paulo: Brasiliense, 32ª Ed.
Brasília/DF., 18 de novembro de 2003.

Introdução

A Sociologia, através de seus métodos de investigação científica, procura compreender e explicar as estruturas da sociedade, criando conceitos e teorias a fim de manter ou alterar as relações de poder nela existentes.

O século XVIII pode ser considerado um período de grande importância para a história do pensamento ocidental e para o início da Sociologia. A sociedade vivia uma era de mudanças de impacto em sua conjuntura política, econômica e cultural, que trazia novas situações e também novos problemas. Consequentemente, esse contexto dinâmico e confuso contribui para eclodirem duas grandes revoluções – a Revolução Industrial, na Inglaterra e a Revolução Francesa.

Capítulo Primeiro – O Surgimento

Um dos fatos de maior relevância foi o surgimento do proletariado, classe trabalhadora com importante papel histórico na sociedade capitalista.

Os proletários sentiam-se explorados, e muitas vezes, sua revolta se refletia na destruição das máquinas e equipamentos. Gradativamente, eles vão se organizando e formando sindicatos com o objetivo de se defender dos proprietários dos meios de produção e do próprio sistema capitalista vigente. Ao protestar e ao buscar mudanças, a classe operária se inclinava ideologicamente ao socialismo.

A introdução de novas formas de organizar a vida social e a profundidade das transformações, de certa forma, colocou a sociedade em evidência. Em decorrência disso, determinados pensadores passaram a considerá-la um objeto que deveria ser investigado e analisado com metodologia científica adequada.

Pensadores como Owen, William Thompson, Jeremy Bentham podiam ter opiniões diferentes em relação a alguns aspectos da Revolução Industrial, mas eram unânimes em afirmar que ela estava criando novos fenômenos, dignos de serem estudados. A Sociologia, então, foi se formando e se consolidando como se fosse uma resposta intelectual às novas condições de existência – a situação do proletariado, a estrutura das cidades industriais, os avanços tecnológicos, a organização do trabalho nas fábricas – originadas pela Revolução Industrial.

Principalmente no século XVII, a tendência sobrenatural e dogmática de se explicar os acontecimentos foi sendo naturalmente substituída por uma visão racionalista de mundo. Para o racionalista Francis Bacon (1561-1626), a teologia deixaria de ser a forma norteadora do pensamento para dar lugar ao novo método científico de conhecimento baseado na observação e na experimentação sistemática e objetiva dos fatos. Segundo ele, dessa maneira seria também possível descobrir e formulas leis gerais sobre a sociedade.

Já, no século XVIII, foi o pensamento social que evoluiu e fez novas descobertas. Segundo Vico (1668-1744), a sociedade podia ser compreendida, pois, ao contrário da natureza, seria o próprio homem o agente produtor da história. Mais tarde, essa postura intelectual seria amadurecida por Hegel e Marx.

Uma das correntes mais importantes desse mesmo século foi o Iluminismo, originado na França. Os pensadores iluministas tinham como proposta procurar transformar não apenas as antigas formas de conhecimento, mas a própria sociedade. Criticavam as características do feudalismo e os privilégios de sua classe dominante em defesa dos interesses burgueses.

Estudando as instituições da época, os iluministas procuraram demonstrar que elas eram injustas e irracionais e , segundo eles, por constituírem um obstáculo à liberdade do indivíduo, deveriam ser eliminadas.

Paralelamente, o homem comum também estava deixando de se submeter cegamente às instituições sociais e às normas existentes. Elas não eram mais vistas como inacessíveis e imutáveis, mas sim como fenômenos passíveis de serem conhecidos e transformados, afinal, são produtos da atividade humana. Na verdade, os tempos estavam mudando e a crescente racionalização da vida social iria contribuir para a constituição de um estudo científico sobre a sociedade.

A Revolução Francesa também foi uma circunstância que agilizou o processo de formação da Sociologia. Ao final do século XVIII, a monarquia absolutista da França estava assegurando inúmeros privilégios à minoritária classe dominante, enquanto deixava à margem de assistência uma população de 23 milhões de pessoas. Além disso, o arcaico sistema vigente impedia a constituição da livre empresa, a exploração eficiente da terra e abafava as iniciativas da burguesia. Obviamente, a situação era contraditória e não iria se sustentar por muito tempo.


Enfim, em 1789, com a mobilização das massas de trabalhadores pobres, a burguesia tomou o poder. O seu objetivo, na realidade, não girava apenas em torno da mudança da estrutura do Estado. Havia o claro desejo de abolir radicalmente a antiga forma de sociedade, suas instituições e seus costumes, promovendo e inovando aspectos da economia, da política, da religião e da vida cultural. Os velhos privilégios de classe foram destruídos e o empresariado passou a ser incentivado e apoiado.


Capítulo Segundo – A Formação

Diante do profundo impacto que a Revolução Francesa causou, vários pensadores franceses da época – como Saint-Simon, Comte e Le Play – passaram a procurar soluções para o estado de desorganização em que se encontrava a nova ordem social. Todavia, para se chegar a uma estabilização dessa nova ordem, seria preciso, segundo eles, conhecer as leis que regem os fatos sociais e, assim, instituir uma ciência da sociedade.

Ao início do século XIX, o capitalismo emergente desencadeou o processo de industrialização na França, especialmente no setor têxtil. Determinadas situações sociais vividas pela Inglaterra no período de sua Revolução Industrial se repetiram na sociedade francesa.

Na terceira década desse mesmo século, houve a intensificação das crises econômicas e das divergências entre as classes sociais. Os trabalhadores franceses passaram a contestar o sistema capitalista, mas foram violentamente reprimidos pela burguesia, a qual acreditava que seria muito difícil criar uma ordem social estável e organizada.

Percebe-se, portanto, que a Sociologia se formou a partir de um contexto histórico-social complexo e bipolarizado. Primeiramente, ela assumiu o papel intelectual de repensar o problema da ordem social, enfatizando a necessidade da existência de instituição como a autoridade, a família, a hierarquia a destacando a importância teórica delas para o estudo da sociedade.

Segundo Le Play (1806-1882), não seria o indivíduo isolado o elemento fundamental para a compreensão da sociedade, mas sim a unidade familiar. Estudou diversas famílias de trabalhadores sob a industrialização e pôde observar que elas estavam mais instáveis do que anteriormente. Le Play acreditava que se os respectivos papéis tradicionais do homem e da mulher dentro da família fossem resgatados, as famílias e a própria sociedade poderiam adquirir mais equilíbrio.

Os antagonismos de classe existentes na sociedade capitalista são uma característica muito forte desse sistema e, por isso, não há uma única tendência do pensamento sociológico. O que existe é uma multiplicidade de visões sociológicas a respeito da sociedade, do objeto de estudo e dos métodos de investigação dessa disciplina. Essas visões deram origem às diferentes tradições sociológicas ou distintas sociologias.

Alguns sociólogos encararam o capitalismo com otimismo, identificando os valores e os interesses da elite como representativos do conjunto da sociedade. Partindo da percepção desses estudiosos, o funcionamento eficiente das instituições políticas e econômicas é um fenômeno essencial e as lutas de classe não passam de acontecimentos transitórios. Essa tradição sociológica que se colocou a favor da ordem instituída pelo capitalismo teve como base o pensamento conservador.

Os conservadores ou profetas do passado – como por exemplo, Edmund Burke (1729-1797), Joseph de Maistre (1754-1821) e Louis de Bonald (1754-1840) – cultivavam o pensamento medieval. Por um lado, admiravam a estabilidade, a hierarquia social e as instituições religiosas e aristocráticas do feudalismo e, por outro, combatiam com fervor as idéias iluministas que teriam desencadeado, segundo eles, o trágico e nefasto acontecimento do final do século XVIII – a Revolução Francesa.

Aos conservadores não interessava defender o capitalismo que se acentuava cada vez mais. De maneira pessimista, enxergavam a sociedade moderna em decadência, não consideravam nenhum progresso no urbanismo, na industrialização, na tecnologia e no igualitarismo. A sociedade lhes parecia mergulhada no caos, na desorganização e na anarquia. Afirmavam que para haver ordem e coesão social, seria necessário a existência de instituições fortes, tradição e valores morais.

É entre os sociólogos positivistas – Saint-Simon, Auguste Comte, Émile Durkheim – que as idéias conservadoras exerceram grande influência. Apesar de admirarem a linha de pensamento conservador, eles acreditavam que devido às novas circunstâncias históricas, seria impossível restaurar as instituições medievais; não seria adaptável. Pode-se dizer que a oficialização da Sociologia foi uma criação do positivismo. A Sociologia de inspiração positivista visa a criar um objeto autônomo – o social – e a instaurar uma relação de independência entre os fenômenos sociais e econômicos.

Saint-Simon (1760-1825) possuía uma faceta progressista, posteriormente incorporada ao pensamento socialista, porém neste trabalho será dada maior ênfase ao seu lado positivista. Esse pensador acreditava que a existência de uma ciência da sociedade seria vital para a restauração da ordem na sociedade francesa pós-revolucionária. Assim, a nova ciência deveria descobrir as leis do progresso e do desenvolvimento social.

De acordo com sua visão otimista em relação à industrialização, Saint-Simon considerava que ela traria progresso econômico, segurança para os homens e reduziria consideravelmente os conflitos sociais. Como medida de apoio, o pensamento social deveria orientar a indústria e a produção. Ele admitia, porém, a existência de conflitos entre dominantes e dominados e devido a isso, sustentava a idéia de que os industriais e os cientistas deveriam procurar melhorar as condições de vida dos trabalhadores. Caberia, também, à ciência da sociedade descobrir novas normas capazes de guiar a conduta da classe trabalhadora, refreando seus ímpetos revolucionários.

Segundo vários historiadores do pensamento social, muitas idéias de Saint-Simon foram incorporadas por Auguste Comte (1798-1857), um dos fundadores da Sociologia que defendia decididamente a nova sociedade.

Émile Durkheim (1858-1917) compartilhava com Comte a preocupação com a ordem social. Caracterizava a sociedade industrial como que submersa em um estado de anomia, isto é, a ausência de regras claramente estabelecidas que pudessem reger e controlar a conduta dos indivíduos. A partir daí, em uma de suas teses sustentava que o estado de anomia incidia diretamente no crescente número de suicídios.

Durkheim afirmava que os fatos sociais são coercitivos e exteriores às consciências individuais. Por exemplo, devido ao caráter impositivo desses fatos, os indivíduos, segundo ele, são levadas a se comportar de acordo com as regras preestabelecidas pelas gerações anteriores. Por isso, ele negava a existência da criatividade humana no processo histórico.

Os filósofos Marx (1818-1883) e Engels (1820-1903) merecem destaque por suas pesquisas de cunho sociológico e socialista. Esses dois estudiosos procuraram oferecer uma explicação da sociedade como um todo e, por isso, não estavam preocupados em fundar a Sociologia como disciplina específica. Em seus trabalhos, percebe-se uma profunda interligação entre os campos do saber. A formação teórica do socialismo marxista constituiu uma complexa operação intelectual e crítica de assimilação das três principais correntes do pensamento europeu do século passado – o socialismo, a dialética e a economia política.

Para Marx e Engels, a função da Sociologia não poderia se limitar apenas a solucionar os problemas sociais para restabelecer a ordem e o bom funcionamento da sociedade, como imaginavam os positivistas. A Sociologia deveria realizar mudanças radicais na sociedade, unindo teoria e ação, ciência e os interesses da classe proletária.

Já, o sociólogo alemão Max Weber (1864-1920) defendia a neutralidade científica, segundo a qual o cientista jamais deveria defender preferências políticas e ideológicas a partir de sua atividade profissional. Isso acarretaria um isolamento da Sociologia dos movimentos revolucionários e a profissionalização da disciplina. Weber via o cientista como homem do saber, das análises frias e penetrantes; e o político como homem de ação e decisão, comprometido com as questões práticas da vida. Dessa forma, a ciência deveria oferecer ao homem de ação, a compreensão da sua conduta, das motivações e das conseqüências de seus atos.

O desenvolvimento da Sociologia teve como pano de fundo a burguesia ascendendo politicamente e com freqüência utilizando mecanismos ideológicos e repressivos para assegurar sua dominação. O surgimento de grandes empresas monopolizadoras de produtos e mercados, a eclosão de guerras entre as grandes potências mundiais, a crescente organização política dos movimentos revolucionários socialistas em diversos países eram realidades históricas que abalavam as crenças da perfeição da sociedade capitalista, evidenciando seu caráter transitório.

Sem dúvida, a crise do capitalismo trouxe repercussões no pensamento sociológico contemporâneo. As ciências sociais – Antropologia, Ciência Econômica, Ciência Política – de modo geral, passaram a ser utilizadas para produzir conhecimentos úteis à Dominação vigente. A própria Sociologia, exceto as tendências que receberam influência socialista, passou a ser uma técnica de manutenção da ordem estabelecida.

Nenhum comentário:

Postar um comentário